Vivemos em uma era em que tudo parece precisar de palco. Do café da manhã ao pôr do sol, das conquistas profissionais aos momentos íntimos, quase nada escapa da lógica da exposição. “Poste ou não aconteceu” tornou-se o mantra silencioso que guia comportamentos. Mas o que essa busca incessante por performance e validação está fazendo com a nossa vida real?
A cultura da performance não começou com as redes sociais, mas foi nelas que encontrou terreno fértil. Hoje, é comum medir o próprio valor pelo número de curtidas, comentários ou visualizações. O problema é que essa régua nunca é justa — porque sempre haverá alguém que parece ter mais: mais viagens, mais beleza, mais conquistas, mais sucesso. E nessa comparação silenciosa, muita gente se perde de si mesma.
Pesquisas recentes apontam que o tempo médio que passamos conectados às redes sociais tem crescido de forma acelerada em todo o mundo. Esse uso excessivo está associado a impactos significativos na saúde mental, como aumento da ansiedade, da depressão, distúrbios do sono e queda na autoestima — especialmente entre jovens e adultos.
É o paradoxo da era digital: nunca estivemos tão conectados — e, ao mesmo tempo, tão sozinhos.
A armadilha está no fato de que a performance promete reconhecimento, mas entrega esgotamento. Vivemos para mostrar, e não para sentir. Organizamos o cenário perfeito para a foto, mas esquecemos de aproveitar o instante. Trabalhamos além da conta para provar competência, mas nos distanciamos de quem amamos. Criamos versões editadas de nós mesmos, enquanto nossa essência vai ficando escondida nos bastidores.
O mais grave é que esse ritmo não se sustenta. A pressão constante por mostrar-se produtivo, feliz, impecável, gera uma sensação crônica de inadequação. Se não estamos sempre entregando, sorrindo, postando, parecemos estar falhando. A vulnerabilidade, que nos humaniza, passa a ser vista como defeito — e assim seguimos exaustos, interpretando papéis que não correspondem ao que realmente somos.
É urgente questionar: estamos vivendo ou apenas representando?
Quando a vida se resume a performance, perdemos a chance de viver com presença. Não há filtro que substitua um abraço real, não há curtida que se compare ao olhar de alguém que nos ama, não há número que preencha o vazio de uma vida sem sentido.
Romper com essa lógica não significa abandonar tudo, mas ressignificar. É lembrar que não precisamos provar valor o tempo todo. É permitir-se existir sem aplausos, reconhecer que não somos máquinas de performance, mas seres humanos com limites, dores e beleza na imperfeição.
A verdadeira liberdade começa quando paramos de viver para mostrar e voltamos a viver para sentir. Quando escolhemos a autenticidade em vez da máscara, a presença em vez da pressa, a essência em vez da aparência.
Porque, no fim, não é sobre quantos nos aplaudem, mas sobre como conseguimos, em silêncio e verdade, viver uma vida que faça sentido para nós.
Por Priscilla Cruz – Mentora de Comunicação, Psicanalista e Palestrante
@priscillacruzoficial
